1) Introdução
Atire a primeira pedra aquele advogado previdenciarista que jamais teve um pedido de auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença) negado pelo INSS! 😂
Sei que se trata de uma situação mais comum do que gostaríamos, por isso resolvi escrever esse artigo para vocês. Hoje vou desmistificar alguns aspectos sobre o tema e trazer dicas práticas sobre como agir diante da negativa do benefício pela autarquia.
Aliás, lembre-se que é preciso se atentar à nova nomenclatura do benefício pós Reforma da Previdência, visto que o auxílio-doença passou a ser chamado de auxílio por incapacidade temporária.
Feitas essas considerações iniciais, vamos ao artigo!
2) Quem tem direito ao auxílio-doença / auxílio por incapacidade temporária?
O auxílio-doença (auxílio por incapacidade temporária) é destinado a todas as classes de segurados do RGPS que, cumprindo a carência , restarem incapacitados para o trabalho ou atividade habitual de maneira temporária , por mais de 15 dias consecutivos, em razão da ocorrência de moléstia relacionada ou não com o labor.
Ou seja, todo segurado do INSS que preencher os requisitos do art. 59 da Lei n. 8.213/91 , possui o direito de receber o auxílio-doença.
2.1) Requisitos do auxílio-doença / auxílio por incapacidade temporária
O art. 59 da Lei n. 8.213/1991 apresenta três requisitos obrigatórios, que devem ser preenchidos cumulativamente pelo segurado para a concessão do benefício:
- carência;
- qualidade de segurado;
- incapacidade para o trabalho.
A seguir, vou explicar separadamente cada um desses requisitos!
2.1.1) Carência
Carência é o número mínimo de contribuições mensais que o segurado precisa pagar para fazer jus ao benefício.
Em regra , a carência para concessão do auxílio-doença corresponde à 12 contribuições mensais. No caso do segurado especial , são exigidos 12 meses de atividade rurícola ou pesqueira em regime de economia familiar de subsistência.
Em algumas situações, no entanto, há exceções que dispensam qualquer carência , podendo o benefício ser concedido de plano. Isso ocorre em casos de incapacidade decorrente de:
- acidente de trabalho ou de qualquer natureza;
- doença profissional;
- doença do trabalho;
- moléstias graves listadas em ato regulamentar.
Atualmente, as referidas doenças graves estão listadas no art. 30, §2º do Decreto n. 10.410/2020, cujo rol consta a seguir:
- tuberculose ativa;
- hanseníase;
- alienação mental;
- esclerose múltipla;
- hepatopatia grave;
- neoplasia maligna;
- cegueira;
- paralisia irreversível e incapacitante;
- cardiopatia grave;
- doença de Parkinson;
- espondiloartrose anquilosante;
- nefropatia grave;
- estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante);
- síndrome da imunodeficiência adquirida (aids); ou
- contaminação por radiação, com base em conclusão da medicina especializada.
2.1.2) Qualidade de segurado
Segurado ou pessoa com qualidade de segurado é o termo usado para se referir à todos aqueles que contribuem para o INSS e que, portanto, têm direito à cobertura previdenciária.
Salienta-se que, mesmo se o segurado parar de contribuir para o INSS, ele aindamantém a qualidade de segurado por algum tempo (período de graça).
2.1.3) Incapacidade para o trabalho
O auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença) será devido ao segurado que ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Ou seja, é necessário que a incapacidade perdure por mais de 15 dias seguidos (não pode ser em períodos intercalados) e deve ser temporária (se permanente, o benefício a ser pleiteado será a aposentadoria por invalidez).
Lembrando que essa incapacidade pode ser resultado de doença (comum, profissional ou do trabalho) ou de um acidente (de trabalho ou de qualquer natureza), e deve obrigatoriamente ser comprovada por meio de perícia médica do INSS.
[Leia também: O que significa “prejudicado” no laudo pericial?]
3) Laudo e perícia médica
Como mencionei, a perícia médica é uma etapa obrigatória para a concessão do auxílio-doença, visto que é através dela que o INSS constata a presença ou não da moléstia temporária.
Contudo, a avaliação do perito não se restringe a somente o exame do segurado, se estendendo também à análise de outros documentos que o periciando apresentar.
Desse modo, o advogado deve instruir o cliente a também levar no dia da perícia:
-
Laudo assinado por médico particular ou do SUS : em que conste as manifestações clínicas do profissional que vem acompanhando seu quadro (salienta-se que este laudo deve cumprir os requisitos previstos no art. 3º, parágrafo único, da Resolução n. 1.658/2002, do Conselho Federal de Medicina);
-
Receituários : indicações dos medicamentos que o requerente está utilizando;
-
Declarações de tratamento : que contenha os tratamentos que a pessoa fez ou ainda está fazendo. Se for o caso de uma perícia psiquiátrica, mencione os tratamentos psicológicos e/ou psiquiátricos.
-
Prontuários médicos: se frequenta alguma clínica ou foi internado em hospital (neste documento poderá conter inclusive as manifestações clínicas).
Obs.: É válida a anexação de cópias dos prontuários (não precisa ser o original).
- Boletins de Ocorrência (B.O.): no caso de benefícios acidentários ou acidentes de qualquer natureza, é interessante juntar o B.O. Isso é mais uma comprovação de que realmente houve o acidente.
Como a avaliação do médico perito do INSS leva em conta a sua análise no momento da perícia, associada a outros documentos comprobatórios, é interessante que o requerente vá munido de toda a documentação da forma mais completa possível!
Lembrando que, durante o período de isolamento social em razão da pandemia de coronavírus , a perícia médica está sendo realizada de forma remota, o que requer uma atuação ainda mais efetiva do advogado em relação à etapa da perícia.
[Leia também: Teleperícia bem sucedida: dicas da perita para garantir o benefício na pandemia.]
4) Por que o INSS nega auxílio-doença / auxílio por incapacidade temporária?
Em geral, o motivo do INSS negar a concessão do auxílio-doença é porque constatou que aquele segurado não preencheu cumulativamente os requisitos obrigatórios (carência, qualidade de segurado e / ou incapacidade para o trabalho).
Ou seja, se o requerente deixou de cumprir apenas um dos requisitos, tal situação já justifica a negativa do benefício.
Em se tratando de auxílio-doença, o mais comum é que a negativa se dê em razão da não constatação da incapacidade temporária no momento da perícia. Por isso é tão importante que o periciando apresente todas as documentações que mencionei no tópico anterior, para facilitar ao máximo a entrega de um laudo positivo pelo perito!
Porém, sabemos que muitas vezes injustiças ocorrem, de modo que muitos segurados que realmente apresentam a moléstia e cumpriram a todos os requisitos obrigatórios, acabam tendo seu benefício negado.
5) O que fazer quando o INSS nega o auxílio-doença?
Se o INSS negou injustamente a concessão do auxílio-doença de seu cliente, você terá a opção de tentar resolver o impasse pela via administrativa ou pela via judicial.
5.1) Via administrativa
Neste caso, primeiro existe a possibilidade de se protocolar um pedido de reconsideração ao INSS, que tem como objetivo solicitar uma nova perícia médica , que pode ou não ser realizada pelo profissional anterior (sim, há chances de que o mesmo médico faça a nova perícia).
Se você não possui interesse em utilizar-se da opção anterior, você pode ingressar diretamente com recurso administrativo na autarquia, apresentando de forma detalhada (inclusive anexando laudos e documentos) os motivos pelos quais o órgão deve aceitar o pedido e conceder o benefício ao seu cliente.
O prazo para ambos os protocolos (pedido de reconsideração e recurso administrativo) é de 30 dias , a contar da data da ciência da resposta negativa.
A vantagem da via administrativa é que não exige o pagamento de custas pelo cliente. Porém, o procedimento costuma ser moroso e, não raras as vezes, o pedido acaba sendo negado ao final , o que faz com que muitos clientes optem por resolver a questão judicialmente.
5.2) Via judicial
Caso opte por ajuizar ação para a concessão do auxílio-doença, o segurado será avaliado por um perito médico judicial , que se trata de um profissional devidamente habilitado e especialista na patologia em questão (diferentemente do que ocorre na perícia do INSS, que é realizada por um profissional generalista).
Nessa ação, caso seja proferida sentença favorável ao cliente, além de receber o auxílio-doença, ele também fará jus ao valor retroativo à data do requerimento administrativo do benefício no INSS.
Veja o que a minha querida amiga e colega Dr.ª Alessandra Antunes disse sobre este assunto:
6) Conclusão
Diante da negativa do INSS em conceder o auxílio-doença (auxílio por incapacidade temporária), é necessário que o advogado previdenciarista explique ao cliente de forma clara e concisa , quais são as possibilidades existentes para reverter esse quadro.
O pedido de reconsideração e o recurso administrativo ao INSS, são sim uma possibilidade viável e que às vezes garante a concessão do benefício sem que haja a necessidade de ajuizar uma demanda judicial.
Contudo, infelizmente percebemos que, na prática, a via administrativa não costuma ser eficaz nestes casos, de modo que uma ação judicial acaba se mostrando a melhor opção para efetivamente se obter a concessão do benefício.
7) Fontes
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____________. Decreto n. 10.410, de 30 de junho de 2020. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 1º de agosto de 2020. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/decreto/D10410.htm>. Acesso em: 03/07/2020.
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