1) Introdução
Você, advogado que está lendo este artigo, anunciaria seus serviços advocatícios na OLX?
Pois é, por mais curiosa e incomum que essa situação possa parecer, saiba que alguns colegas já fizeram isso e tiveram procedimentos éticos / disciplinares instaurados contra eles.
Compreendo que, em um primeiro contato , essa vedação pode parecer um pouco óbvia. Porém, depois que me aprofundei mais sobre o tema, constatei que o raciocínio por trás dessa pergunta não era tão simplista assim , trazendo argumentos realmente relevantes.
Como vocês sabem que adoro compartilhar com nossos leitores tudo aquilo que aprendo em minhas pesquisas, decidi escrever este artigo completo sobre os motivos que levam o anúncio de serviços advocatícios em sites de compra e venda , como a OLX, a ser considerado como infração ética.
Antes de irmos ao conteúdo, tenho um convite para você que já acompanha o blog. No nosso Perfil de Instagram (@desmistificando) você pode ter acesso gratuito a dicas e informações práticas que produzimos em posts e lives. Para ter acesso, basta seguir e acompanhar a gente por lá.
2) Advogado pode anunciar na OLX?
2.1) Parecer do TED da OAB/ES
Em janeiro de 2019, foi apresentada uma Consulta ao Tribunal de Ética e Disciplina da OAB do Espírito Santo , questionando se um advogado poderia divulgar informações para contato no site da OLX.
Segue o teor da Consulta formulada pelo advogado:
“Ante a ausência de atuação da Comissão de Publicidade e Propaganda neste início de gestão, venho por meio deste realizar consulta, haja vista a urgência que possuo em receber tal tipo de informação.
Considerando que o art. 46 do Código de Ética da OAB permite a publicidade via internet e que o art. 39 do mesmo diploma legal dispõe que a publicidade profissional do advogado tem caráter meramente informativo e deve primar pela discrição e sobriedade;
Considerando a consulta realizada com a então presidente da Comissão de Publicidade e Propaganda na gestão anterior da OAB/ES (vide email em anexo);
Gostaria de saber se anunciar nome, número da OAB, área de atuação, titulação acadêmica e forma de contato no site OLX configura infração ao Código de Ética.
Não sendo vedada a veiculação de tais informações em classificados de jornal , em tese, não haveria razão para ser vedada a veiculação no site OLX , isto porque o Provimento nº 94/2000 do Conselho Federal da OAB, ao regulamentar a publicidade informativa, admite como veículo de divulgação publicitária da advocacia [sic] a internet, sendo tal meio limitado/regulado pelas disposições apostas no art. 2º do mesmo provimento (dispondo sobre o conteúdo da publicidade informativa).
Assim, sendo o nome, número da OAB, área de atuação, titulação acadêmica e forma de contato (tão somente tais informações) caracterizadores de uma publicidade moderada (discrição e sobriedade), gostaria de posição da OAB/ES acerca da temática”. (g.n.)
Perceba que o raciocínio utilizado pelo colega não foi absurdo.
Afinal, se é permitido veicular informações como nome, número da OAB, área de atuação, titulação acadêmica e forma de contato em classificados de jornais , aparentemente não haveria empecilho para que o mesmo fosse realizado em sites de compra e venda, como a OLX.
Porém, em resposta à uma Consulta (Processo n. 13972019-0), a 1ª Turma de Deontologia do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/ES , por unanimidade, entendeu que a disponibilização dos dados do advogado em sites de vendas teria nítido caráter de anúncio.
Na ocasião, a Turma concluiu que seria vedada tal conduta, sob pena de caracterizar as infrações descritas nos incisos IV e XXV do art. 34 do Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil ( captação de clientela e manter conduta incompatível com a advocacia ).
Confira a Ementa:
“CONSULTA – POSSIBILIDADE DE ANUNCIAR/DISPONIBILIZAR NOME DE ADVOGADO NO SÍTIO ELETRÔNICO OLX – CONSULTA ADMITIDA – CONDUTA VEDADA. (i) Admite-se consulta quando se tratar de situação hipotética e não se verificar interesse de obtenção de prejulgamento para caso específico. Inteligência do art. 45 do RITED/OAB/ES; (ii) É irregular (e, portanto, conduta vedada ) a disponibilização de nome, número de inscrição, área de atuação, titulação acadêmica e contato no sítio eletrônico OLX ; (iii) A uma porque tal sítio eletrônico tem genuíno propósito mercantilista , de atos de mercancia, os quais são incompatíveis com a advocacia, pela dicção do art. 5.º do CED e do art. 4.º, alínea l do Provimento n.º 94/2000 do CFOAB; (iv) A duas porque tal ato tem nítido caráter de “anúncio” , e, por aí dizer, de propaganda , já que o desígnio é de “pulverizar” o nome do Advogado e/ou da Sociedade de Advogados, não se tratando de um mero conteúdo discreto e dirigido a um público destinado (vide, publicidade), como determinam os preceitos éticos da OAB, em particular o art. 39 do CED; (v) Atendendo à consulta empreendida, conclui-se ser vedado ao Advogado anunciar-se no sítio eletrônico OLX e similares, podendo, em tese, tal conduta caracterizar as infrações descritas nos incisos IV e XXV do art. 34 do EAOAB” . (g.n.)
(Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/ES, 1ª Turma de Deontologia, Processo n. 13972019-0, Relator Dr. Bruno Richa Menegatti, Julgamento: 22/03/2019)
Mesmo que exista certa lógica no raciocínio utilizado pelo advogado que formulou a Consulta, tenho que assumir que concordo com o parecer do TED da OAB/ES.
Anunciar nos classificados da OLX , mesmo que seja somente para fins de divulgação de informações para contato, possui sim um viés mercantil e, na medida em que destina-se a um público indeterminado, configura captação de clientela.
2.1.1) O propósito mercantilista da OLX
Em um interessante trecho de seu voto, o Relator, Dr. Bruno Richa Menegatti, fala sobre o propósito mercantilista da OLX , que inclusive estava expresso na descrição institucional do site em 01/02/2019 (de acordo com as informações contidas no voto).
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Desse modo, o intuito do sítio eletrônico OLX seria o de conectar o maior número de pessoas com o objetivo exclusivo de comprar e vender.
O ato de “negociar”, ou seja, de comprar e vender, sem desconfianças, seria ato de mercantilismo/mercancia , que é vedado, categoricamente, pelos preceitos da advocacia (art. 5º do Código de Ética e Disciplina) .
Conforme expliquei no artigo sobre Publicidade na advocacia: por que a OAB é tão rigorosa?, o termo “mercantilização” deriva de “mercado” , que remete à local de venda, compra e troca de bens e de serviços, ou seja, um comércio.
Desse modo, mercantilização da advocacia seria oferecer serviços jurídicos como um item de comércio comum , que o advogado conseguisse ofertar a um grupo genérico e indistinto de pessoas , pois aquele serviço não seria especializado.
E, na minha interpretação, “especializado” não faz referência quanto à especialidade do universo de conhecimento. “Especializado” seria no sentido de que é um serviço único, moldado àquele caso, para aquela pessoa, totalmente particular.
Nessa linha de raciocínio, sabemos que os serviços jurídicos , em maior ou menor grau, são especializados. Por mais que o procedimento para requerer o BPC, por exemplo, siga um certo padrão, o caso de cada cliente possui suas peculiaridades, assim como a estratégia e a defesa que cada advogado irá aplicar não serão iguais.
É por isso que os serviços de um advogado não devem ser banalizados e muito menos mercantilizados , de modo que entendo estar correto e em sintonia com os preceitos éticos o posicionamento adotado pelo TED da OAB/ES.
2.1.2) Se advogado pode estar no Facebook, por que não na OLX?
O fato de o advogado possuir página ou perfil profissional nas redes sociais como forma de divulgar seus serviços , desde que respeite as normas éticas da OAB, não caracteriza infração disciplinar.
Como expliquei no artigo sobre Advogado poder fazer propaganda no Facebook ou Instagram, a única ressalva que se faz é que tal uso das redes sociais deve ser desprovido de mercantilização (é proibida a captação de clientela), incentivo ao litígio e engrandecimento do advogado (autopromoção).
O conteúdo publicado deve apenas possuir caráter informativo , respeitando a moderação, a discrição, a dignidade, a moral e a ética advocatícia. Fazer uso do marketing de conteúdo nas postagens e publicações, por exemplo, é algo permitido pela OAB.
Agindo dessa forma nas redes sociais, o advogado estará fazendo publicidade e não propaganda.
Compreendo que, a princípio, esses termos podem até parecer sinônimos, mas é preciso ter em mente que não são.
A propaganda está mais vinculada à ideia de comércio ou mercantilização de produtos e visa alcançar público maior, incentivando a demanda para maior lucro de empresário ou comerciante. Já a publicidade é a informação mais discreta, sem alardes, para público menor e direto, pressupondo a existência de interesse anterior, por menor que seja.
Ao anunciar suas informações de contato na OLX (nome, número da OAB, área de atuação, titulação acadêmica e meios de comunicação), o advogado está fazendo propaganda de seus serviços.
Como o objetivo é de “pulverizar” o nome do advogado e/ou da sociedade de advogados entre a coletividade com o intuito de angariar clientes , não se trata de um mero conteúdo discreto e dirigido a um público certo e determinado (como ocorre na publicidade nas redes sociais, em que o advogado publica para seus amigos e seguidores).
Veja o que diz o voto já mencionado:
“Averba-se, em adição, que o mero fato de ser autorizado, em tese, a publicidade em lista telefônica e/ou em redes sociais, não estende essa percepção para o sítio eletrônico OLX, já que aqueles meios de informação/comunicação não possuem, em sua essência, o propósito mercantilista .”
É por isso que é permitido que o advogado desenvolva sua publicidade através das redes sociais e é vedado que o advogado realize propaganda ou anúncio na OLX.
[Leia também: Cartão de visita digital para advogado é permitido pela OAB?]
2.2) Este posicionamento pode ser estendido às demais seccionais?
Como a mencionada Consulta foi encaminhada e respondida pelo Tribunal de Ética e Disciplina da OAB do Espírito Santo , o posicionamento adotado no acórdão se restringe à Seccional daquele estado , sendo aplicado apenas aos advogados de lá.
Infelizmente, ainda não existe norma de caráter geral que trate expressamente sobre assunto. Nem o Estatuto da Advocacia e da OAB, o Provimento n. 94/2000 do Conselho Federal da OAB e o Código de Ética e Disciplina da OAB, disciplinam a questão.
Porém, verifiquei que o Tribunal de Ética e Disciplina da OAB do Tocantins também compartilha do mesmo posicionamento e instaurou processo ético/disciplinar contra advogados que anunciavam serviços no aplicativo de vendas da OLX.
Até o presente momento, estas foram as únicas informações que encontrei sobre TEDs se posicionando especificamente a respeito da possibilidade ou não de o advogado anunciar na OLX.
Porém, caso você conheça o posicionamento dos TEDs de outros estados sobre o assunto, compartilhe comigo nos comentários! 😉
3) Advogado pode anunciar em outros sites de venda?
Conforme expliquei, os tradicionais sites de compra e venda possuem um nítido viés mercantil , sendo praticamente impossível dissociar essa característica dos anúncios que são publicados por lá.
Esses anúncios possuem o objetivo de fazer propaganda e divulgar os serviços ao maior número de pessoas possível (ou seja, a uma coletividade, a um grupo indeterminado).
Desse modo, o advogado que anuncia seus serviços em sites de venda, mesmo que o anúncio contenha apenas dados de contato, está mercantilizando a profissão e utilizando estratégia de captação de clientela , o que é vedado pela OAB.
Além disso, pelo menos na ementa do TED da OAB/ES (que citei anteriormente), a Turma estendeu o entendimento proibitivo à sites similares à OLX:
“[…] Atendendo à consulta empreendida, conclui-se ser vedado ao Advogado anunciar-se no sítio eletrônico OLX e similares , podendo, em tese, tal conduta caracterizar as infrações descritas nos incisos IV e XXV do art. 34 do EAOAB”. (g.n.)
Portanto, em se tratando de outros sites de compra e venda , mesmo que não sejam nos exatos moldes da OLX, acredito que a vedação aos anúncios também deverá ser aplicada.
[Leia também: Como conseguir clientes na advocacia pela internet sem ofender a OAB]
4) Fraude na OLX envolvendo advogados
Em junho de 2020, a OAB do Mato Grosso do Sul publicou um alerta sobre um golpe que estava sendo aplicado no site da OLX através de anúncios falsos que utilizavam indevidamente o nome e o CPF de advogados do estado.
Como forma de dar credibilidade à venda, os golpistas se passavam por advogados e pediam para que o comprador depositasse o valor em uma conta bancária. Após isso, os golpistas “desapareciam” e o produto não era enviado ao comprador.
Advogados de Mato Grosso do Sul que foram vítimas do golpe entraram em contato com a OAB/MS alertando para os crimes nos quais seus nomes foram usados indevidamente, fazendo vítimas em vários estados do país.
Desse modo, a OAB/MS orienta que os advogados e a sociedade em geral se atentem aos anúncios publicados na internet.
Caso tenha sido vítima do golpe ou conheça alguém que foi vítima, procure a Delegacia de Polícia mais próxima e registre o Boletim de Ocorrência.
5) Conclusão
Apesar de não haver norma contendo expressamente a vedação, a questão dos anúncios de serviços advocatícios em sites de compra e venda (como a OLX) nitidamente configura mercantilização da profissão e captação de clientela , o que, como se sabe, não é permitido pela OAB.
Apesar da publicidade advocatícia ser autorizada pelo órgão, é preciso ter em mente que ela possui restrições e deve obedecer a determinados parâmetros éticos impostos à toda classe.
Se deseja fazer sua publicidade na internet , invista no desenvolvimento de um marketing de conteúdo ético, publicando textos informativos em redes sociais , blogs ou até mesmo em sites jurídicos.
Outra opção, é também desenvolver um branding jurídico capaz de lhe posicionar de forma efetiva no mercado e realmente prospectar clientes.
Para o advogado que almeja desenvolver uma carreira e um legado de sucesso , desrespeitar as normas da OAB nunca é uma boa opção!
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6) Fontes
BRASIL. Lei n. 8.906, de 4 de julho de 1994. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 de julho de 1994. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8906.htm>. Acesso em: 28/07/2020.
____________. Provimento n. 94, de 5 de setembro de 2000. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 12 de outubro de 2000. Disponível em: <https://www.oab.org.br/leisnormas/legislacao/provimentos/94-2000>. Acesso em: 28/07/2020.
____________. Resolução n. 02, de 19 de outubro de 2015. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 19 de outubro de 2015. Disponível em: <https://www.oab.org.br/arquivos/resolucao-n-022015-ced-2030601765.pdf>. Acesso em: 28/07/2020.
____________. Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/ES. Processo n. 13972019-0. Relator: Dr. Bruno Richa Menegatti. Julgamento em: 22/03/2019. Disponível em: <https://www.oabes.org.br/arquivos/2019/ted/CONSULTA_N_13972019-0.pdf>. Acesso em: 11/08/2020.
Migalhas. Advogados não podem anunciar serviços em sites de vendas como OLX. Migalhas, 2019. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/quentes/314788/advogados-nao-podem-anunciar-servicos-em-sites-de-vendas-como-olx>. Acesso em: 11/08/2020.
OAB Mato Grosso do Sul. OAB/MS alerta para uso indevido de dados de advogados em golpes na OLX. OAB/MS, 2020. Disponível em: <http://oabms.org.br/oab-ms-alerta-para-uso-indevido-de-dados-de-advogados-em-golpes-na-olx/>. Acesso em: 11/08/2020.
OAB Tocantins. OAB/TO INSTAURA PROCESSO CONTRA ADVOGADOS QUE ANUNCIAVAM NO OLX. OAB/TO, 2020. Disponível em: <https://www.oabto.org.br/noticia/oabto-instaura-processo-contra-advogados-que-anunciavam-no-olx-1>. Acesso em: 11/08/2020.
STRAZZI, Alessandra. Como conseguir clientes na advocacia pela internet sem ofender a OAB. Desmistificando o direito, 2020. Disponível em: <https://www.desmistificando.com.br/manutencao-qualidade-de-segurado-periodo-de-graca/>. Acesso em: 11/08/2020.
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STRAZZI, Alessandra. Marketing de conteúdo para advogados é permitido pela OAB?. Desmistificando o direito, 2020. Disponível em: <https://www.desmistificando.com.br/marketing-de-conteudo-para-advogados/>. Acesso em: 11/08/2020.
STRAZZI, Alessandra. Branding Jurídico: Guia Completo (Respeitando a OAB). Desmistificando o direito, 2020. Disponível em: <https://www.desmistificando.com.br/branding-juridico/>. Acesso em: 13/08/2020.
STRAZZI, Alessandra. Publicidade na advocacia: por que a OAB é tão rigorosa?. Desmistificando o direito, 2020. Disponível em: <https://www.desmistificando.com.br/publicidade-na-advocacia-rigor-oab/>. Acesso em: 11/08/2020.
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